- Os caminhos da Física.
Nos últimos anos, questões como aquecimento global, esgotamento das fontes de energia não renováveis e aumento da população do planeta aparecem com frequência nos meios de comunicação. Embora não pareçam, tais assuntos estão intimamente relacionados com a Física, pois as causas e as possíveis soluções também são pensados no universo cientifico.
1- a termologia: uma breve história das máquinas térmicas
Com bastante frequência ouvimos falar sobre a necessidade de economizar energia porque ela pode vir a faltar no futuro. Quem faz esse tipo de alerta conhece muito bem a importância do consumo consciente. Desde a Antiguidade até os nossos tempos, a humanidade aumentou milhares de vezes o gasto de energia para suas atividades diárias. Um habitante da Grécia antiga, por exemplo, tinha um consumo energético muitas vezes menor do que um sul-americano médio de hoje. As diferenças ocorrem também entre as diversas regiões de um mesmo país e ainda entre as classes sociais em cada região. Um indígena do Alto Xingu consome bem menos energia que os habitantes do centros urbanos brasileiros, que dela dependem para se locomover, aquecer e iluminar suas casas e acionar eletrodomésticos, por exemplo.
Consumo de energia mundial: em uma descala de 0 a 14 em números pares; do ano de 1965 ate 2013. |
Tratar da distribuição da energia levando em conta as características e as necessidades das diversas regiões é um assunto da Geopolítica, e aparentemente tem pouco a ver com a Física. Em jornais e revistas, noticias sobre o uso de fontes energética costumam aparecer mais nos cadernos econômicos que nos de Ciência. Contudo, as questões políticas e econômicas que envolvem a tomada de decisão da produção e uso de energia dependem de pareceres de engenheiros e cientistas. São os conhecimentos desses profissionais que orientam políticos sobre os recursos energéticos disponíveis e a melhor forma de distribuí-los, a fim de suprir a necessidade da nação de modo sustentável.
Para compreender o aumento do consumo energético, vamos retroceder ao fim do século XVII, na Inglaterra. Até essa época, boa parte da energia consumida provinha da tração animal, usada tanto para o transporte de pessoas como para o funcionamento de máquinas. Havia também energia hídrica, originada da água de rios ou pequenos córregos para movimentar monjolos e moinhos,e eólica, ou seja, do vento, para mover embarcações e moinhos de vento. O calor, outra forma de energia, era obtido da queima de madeira e carvão para aquecer o ambiente e os alimentos.
A escassez de madeira fez com que a procura por outros recursos aumentasse. Assim, o carvão se tornou a principal fonte de energia e não mostrou ser um grande problema quando as minas desse mineral se encontravam próximas da superfície. Na extração de materiais do subsolo, o minério de ferro, matéria-prima da metalurgia, ganhou importância. com o tempo, porém, esses recursos se tornaram raros, obrigando os mineradores a procurá-los em profundidades cada vez maiores. Isso levou ao surgimento de um novo problema: a água. As escavações mais profundas podiam atingir os lençóis freáticos, que alegavam as minas.
Mina Otávio Fontana SC. |
Para eliminar a água parada nas minas, os mineradores resolveram utilizar mecanismos como o parafuso de Arquimedes. Esse dispositivo, criado pelo matemático grego Arquimedes (c. 287 a.C. -c. 212 a.C), consistia em bombear água do fundo da mina para a superfície por meio de um parafuso que girava no interior de um cilindro oco. Esse mecanismo foi usado com muita frequência, mas, como a rotação do parafuso era obtida por tração humana ou animal, buscou-se obter um processo automático e mais eficiente.
Na época, já se conhecia as bombas de sucção, que, no entanto, apresentavam uma limitação: não podiam bombear água de profundidades superiores a 10,33 m.
A explicação sobre essa limitação foi dada por um discípulo de ]galileu Galilei (1564 - 1642), o italiano Evangelista Torricelli (1608 - 1647), que relacionou a elevação de um liquido em um tubo com pressão exterior (atmosférica). Foi somente com o desenvolvimento dos estudos sobre as transformações nos gases e das máquinas que térmicas que se tornou possível construir bombas capazes de retirar a água de profundidades maiores.
Bomba a vácuo movida à explosão de pólvora. Digestor de Papin. |
Em 1680, o físico e matemático holandês Christiaan Huygens (1629 - 1695) construiu uma bomba de vácuo movida á explosão de pólvora. Mas foi seu assistente, o físico francês Denis Papin (1647 - 1712), quem primeiro montou um eficiente sistema que transformava o vapor em movimento. Bem antes dele, na Grécia Antiga, Heron (65 - 125) construiu um aparelho capaz de girar pela ação do vapor, mas que não passou de mera curiosidade. Papin desenvolveu também um digestor, um tipo de panela dotado de uma válvula na tampa que permitia controlar a pressão interna no recipiente. O dispositivo foi o percursos das panelas de pressão.
Essa válvula consistia em uma haste com um peso na extremidade, que funcionava como uma alavanca interpotente sobre a tampa da panela. Quando a pressão no interior da panela atingia determinado valor, a válvula se abria, permitindo o escape parcial do vapor. O desenvolvimento desse dispositivo tornou as máquinas térmicas bem mais seguras para os operadores.
Funcionamento da válvula do digestor de Papin, que permitia o controle da pressão do vapor. |
As figuras ao lado apresentam os principais elementos do digestor de Papin em duas situações. Na primeira, em cima, o peso consegue suportar a pressão produzida pelo vapor no interior do digestor. Em baixo, a haste e o peso foram empurrados pelo vapor, liberando pela válvula o excesso acumulado no interior. Variando a massa do peso, pode-se controlar a pressão interna.
A primeira máquina a vapor de grande porte que teve sucesso comercial foi inventada pelo engenheiro militaar inglês Thomas Savery (1650 - 1715). O princípio de funcionamento dessa máquina é, de maneira simples, análogo ao que aplicamos quando tomamos suco com auxílio de um canudinho. Quando sugamos o ar para dentro da cavidade bucal, reduzimos a pressão no interior do canudo. Como o líquido está sob pressão no interior do canudo, ele sobe até a boca.
A figura mostra a máquina criada por Savery e como ela funcionava. Ela era constituída de uma caldeira integrada a um cilindro e a uma série de tubos e válvulas. A ideia era simples: deixando somente as válvulas A e B abertas, o vapor produzido pela caldeira começava a empurrar o ar e a água do cilindro para o meio externo.
Quando o sistema estava bem quente fechava-se a válvula B e abria-se a válvula C. Resfriando-se o cilindro, a pressão diminuía e a água da mina era empurrada para esse recipiente pela pressão atmosférica. A abertura da válvula D permitia que parte da água do tubo fosse desviada para resfriar o cilindro. Mesmo possuindo uma válvula de segurança, a utilização de vapor e alta pressão acabou provocando muitos acidentes.
Ao mesmo tempo que se desenvolviam essas máquinas, novos experimentos utilizando vapor foram realizados, resultando em outras invenções importantes. O ferreiro inglês Thomas Newcomen (1663 - 1729) aperfeiçoou a Máquina de Savery, adaptando-a para trabalhar com pressão menor, o que diminuía o risco de acidentes. Os avanços na confecção de peças permitiram
que algumas importantes inovações fossem introduzidas nesse sistema. A base dessa máquina era a mesma da máquina de Savery, ou seja, havia uma caldeira que ao ser aquecida produzia vapor, mas acrescentou-se um sistema de cilindro e pistão.
Na montagem anterior, ao empurrar o pistão para cima, o vapor provoca a elevação de um dos braços da balança e a consequente descida do outro. O resfriamento do cilindro causa a descida do pistão devido à diferença de pressão gerada. Nas minas, o vaivém repetidos dos braços levava a água para a superfície. Esse método mostrou-se muito útil também no levantamento de cargas. Um jovem aprendiz que trabalhava em uma dessas máquinas, Humphrey Potter, criou um dispositivo capaz de realizar automaticamente a tarefa de elevar cargas, aproveitando o próprio movimento do sistema. As principais desvantagens da máquina de Newcomen eram o longo tempo necessário para o resfriamento do cilindro e o grande consumo de carvão para o seu funcionamento.
Muitas transformações continuaram acontecendo ao longo do século XVIII, mas uma das mais importantes passou pelas mãos do cientista escocês James Watt (1736 - 1819). Ao tentar concertar uma das máquinas, Watt se deu conta da grande quantidade de energia que era desperdiçada com o
aquecimento e o resfriamento do pistão na máquina de Newcomen. Para um melhor aproveitamento da energia, Watt desenvolveu uma máquina dotada de um sistema duplo de cilindro e pistão. Assim, quando um dos cilindros fosse aquecido, o pistão correspondente seria empurrado para cima e um sistema de engrenagens se encarregaria de abaixar o outro braço e o pistão que movimentaria uma roda acoplada a eles. Em vez de resfriar o cilindro, o vapor quente seria conduzido ao outro cilindro, onde ocorreria a sua condensação.
Essa modificação possibilitou uma série de inovações nas máquinas que resultaram em um ganho de rendimento de praticamente 50% sobre a máquina de Newcomen e uma economia de carvão de quase 70%. Alem da separação entre fonte quente e fonte fria, o engenheiro escocês desenvolveu também uma válvula constituída de duas esferas que ao girarem provocam a abertura da válvula de escape final da máquina, que permitia controlar a velocidade do sistema. Esse invento teve a sua patente registrada em 1769, transformando Watt em um homem rico.
Nesse contexto da Revolução Industrial, é fácil notar o impacto da Ciência do calor e da Tecnologia na sociedade. O desenvolvimento das máquinas térmicas provocou uma redução do número de trabalhadores necessário para o trabalho, gerando um aumento gradativo do desemprego, principalmente a partir do século XVIII. Apesar da massa de desempregados, o crescimento da produção teve como efeito o barateamento dos preços dos produtos e um consequente aumento do consumo. A aplicação dessas máquinas para para movimentar trens, navios e mesmo automóveis foi responsável por uma transformação crucial nos transportes, oferecendo maior mobilidade às pessoas.
A transformação industrial iniciada com as máquinas impulsionou uma total transformação econômica e social na civilização do Ocidente, com aumento no padrão de vida de parte da população.
Esquema da máquina a vapor de Savery: tinha como objetivo retirar a água do interior das minas de carvão. |
A figura mostra a máquina criada por Savery e como ela funcionava. Ela era constituída de uma caldeira integrada a um cilindro e a uma série de tubos e válvulas. A ideia era simples: deixando somente as válvulas A e B abertas, o vapor produzido pela caldeira começava a empurrar o ar e a água do cilindro para o meio externo.
Quando o sistema estava bem quente fechava-se a válvula B e abria-se a válvula C. Resfriando-se o cilindro, a pressão diminuía e a água da mina era empurrada para esse recipiente pela pressão atmosférica. A abertura da válvula D permitia que parte da água do tubo fosse desviada para resfriar o cilindro. Mesmo possuindo uma válvula de segurança, a utilização de vapor e alta pressão acabou provocando muitos acidentes.
Máquina de Newcomen |
Ao mesmo tempo que se desenvolviam essas máquinas, novos experimentos utilizando vapor foram realizados, resultando em outras invenções importantes. O ferreiro inglês Thomas Newcomen (1663 - 1729) aperfeiçoou a Máquina de Savery, adaptando-a para trabalhar com pressão menor, o que diminuía o risco de acidentes. Os avanços na confecção de peças permitiram
Como funcionava a máquina de Newcomen |
Na montagem anterior, ao empurrar o pistão para cima, o vapor provoca a elevação de um dos braços da balança e a consequente descida do outro. O resfriamento do cilindro causa a descida do pistão devido à diferença de pressão gerada. Nas minas, o vaivém repetidos dos braços levava a água para a superfície. Esse método mostrou-se muito útil também no levantamento de cargas. Um jovem aprendiz que trabalhava em uma dessas máquinas, Humphrey Potter, criou um dispositivo capaz de realizar automaticamente a tarefa de elevar cargas, aproveitando o próprio movimento do sistema. As principais desvantagens da máquina de Newcomen eram o longo tempo necessário para o resfriamento do cilindro e o grande consumo de carvão para o seu funcionamento.
Máquina de Watt |
Esquema do funcionamento da máquina de Watt |
Essa modificação possibilitou uma série de inovações nas máquinas que resultaram em um ganho de rendimento de praticamente 50% sobre a máquina de Newcomen e uma economia de carvão de quase 70%. Alem da separação entre fonte quente e fonte fria, o engenheiro escocês desenvolveu também uma válvula constituída de duas esferas que ao girarem provocam a abertura da válvula de escape final da máquina, que permitia controlar a velocidade do sistema. Esse invento teve a sua patente registrada em 1769, transformando Watt em um homem rico.
Máquina de vapor portátil para geração de energia (1899) |
A transformação industrial iniciada com as máquinas impulsionou uma total transformação econômica e social na civilização do Ocidente, com aumento no padrão de vida de parte da população.
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